I
O perdão começa sem palavras,
como água brotando sob a terra:
um rumor que visita o silêncio
e aprende a respirar no escuro.
II
Ele não apaga as pedras do caminho,
mas ensina os pés a tocá-las
com a delicadeza de quem sabe
que cada dor foi um degrau do retorno.
III
O perdão não é esquecimento,
é memória alinhada à luz;
é aceitar que a noite existiu,
e ainda assim abrir as janelas.
IV
No encontro das mãos, um tremor
que não é medo, é desapego:
deixar o peso onde estava,
seguir adiante mais inteiro.
V
Perdoar é devolver ao coração
o espaço que os espinhos ocuparam;
é consentir que o tempo costure
o que a pressa rasgou na alma.
VI
E quando enfim, por dentro, amanhece,
percebemos: não éramos dois inimigos,
mas dois rios confusos
procurando o mesmo mar.